Acaba sair meu mais recente Cordel: A CASA VELHA DE TAIPA.
Composto por 16 estrofes de 7 sílabas e com xilogravura do xilógrafo potiguar Jefferson Campos, "A casa velha de taipa" conta a história em que o eu poético se encontra na velha casa de taipa onde morou e se vê em um porta-retrato. Este retrato, pintado por algum artista, mostra ele, o pai e a mãe em outra realidade, cercado de coisas, diferentemente de sua realidade.
No entanto, ele começa a voltar ao passado e recorda cenas emocionantes vividas décadas atrás; cenas que o retratista que os pintou não conseguiu captar.
Uma leitura emocionante, capaz de nos levar à infância.
Eis algumas estrofes.
A
casa velha de taipa
1
Na casa velha de taipa
Onde morei lá no mato
Eu resgatei minha história
Num velho porta-retrato
Mamãe comigo pequeno
Papai de rosto sereno
Posava sem ter vontade
O artista e sua destreza
Tentavam mostrar riqueza
Onde só tinha humildade.
2
Papai empaletozado
Que o retratista criou
Cobrindo a pele queimada
Que o vapor do sol queimou
Mamãe muito maquilada
De roupa branca, engomada
Eu bem gordinho e linheiro
Tinha no sorriso um brilho
Que mais parecia com filho
De um ricaço fazendeiro.
3
Bem assim atrás da gente
Tinha uma verde paisagem
Saltando d’água uns peixinhos
De uma bonita barragem
Um touro gordo pastando
Um belo cisne nadando
Chega suas asas brilhavam
Na barragem reluzente
E bem de frente ao nascente
Uns passarinhos voavam.
4
Quem visse aquele retrato
Com toda aquela magia
Não via o que ti’a por trás
Daquela fotografia
O fato é que o retratista
Com a sua alma de artista
Repleto de boa vontade
Ou talvez sem perceber
Fez assim para esconder
A nossa simplicidade.
5
Mas quando olhei para o lado
Vi num canto da parede
Um torno de aroeira
Onde eu pendurava a rede
Vi mamãe me balançando
Uma cantiga cantando
Me botando pra dormir
Meu irmão se balançava
Mamãe depressa gritava:
“Cuidado pra não cair!”
[...]
Dei uma olhada na sala
Vi nossa maior beleza
Um rádio antigo de pilha
Tocando em cima da mesa
Devidamente forrada
Com a toalha bordada
Que mãe comprou de titia
De tarde o forró troava
Mas às seis horas parava
Pra tocar “Ave-Maria”.
[...]
Meu nariz denunciou
Um cheiro lá na cozinha
Quando entrei nela, vi mãe
Temperando uma galinha
Ela me disse: “Ande! Venha!
Pegue mais dois paus de lenha
Bote no fogão agora.
Pois seu pai já vem chegando!
Escutei ele falando
No terreiro lá de fora.”
[...]
Ali, por alguns minutos,
Fiquei olhando o terreiro
Vi um ninho de rolinha
No galho de um cajueiro
Dois filhotes bem cuidados
Juntinhos, alimentados
Dormindo com confiança
Olhei pro meu velho abrigo
Assim também foi comigo
Nos meus tempos de criança.
16
Na velha casa de taipa
Onde por anos vivi
Após passar muitos anos
Claramente percebi
Que em nossa simplicidade
Existia felicidade
Sempre existiu! Pode crer!
Mas o velho retratista
Mesmo sendo um grande artista
Não conseguiu perceber.
João Rodrigues
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